quarta-feira, 6 de fevereiro de 2013

Pelos Sonhos do Toiro Bravo - Ferrar - Um Rumo à Glória de Espécies Singulares e Magníficas









Texto e fotografia: Pedro Correia






Nos finais da década de 90, quando acedia pela primeira vez ao mundo através do ecrã de computador, a minha afición moveu-me para ver toiros por outras paragens. Uma imagem de um bezerro bravo no momento da ferra, alojada no site da conceituada Unión de Criadores de Toros de Lidia, e se não estou errado, da autoria de Carlos Núñez, despertou o meu interesse e ficou registada na memória. Quando iniciei este obi de fotografia, aproveitei para nas oportunidades de captar imagens de ferras, tentar reproduzir o mesmo momento, mas desta vez, recriado por mim.





Num disparo, uma imagem intensa, de brutalidade e poder que vale por mais de mil palavras.







Opiniões divergem quanto aos atos dolorosos efetuados sobre o toiro. O exemplo prático da ferra, em que alguns podem entender como um horror ou falta de sensibilidade de quem pratica. Outros, os que a praticam, sentem a dor, olhando a glória futura de autênticos Homens e bovinos gladiadores sobre as arenas. Uma parte de um rito que vai para além da compreensão da utilidade desta prática, enquanto tipo de identificação animal essencial nos sistemas de produção peculiares das ganadarias bravas.






Independentemente, de opiniões ou filosofias de vida, o bovino está inserido em rituais milenares, enraizados por todo o mundo (inclusive em países onde não se praticam corridas de toiros com frequência) que partem de necessidades tão básicas do Homem, como simplesmente a de se alimentar.






Influenciada pela necessidade alimentar, poderá estar a seleção da própria espécie humana, em que no ato das caçadas aos auroques selvagens (bovinos primitivos), os homens mais valentes, provavelmente seriam os preferidos pelas mulheres como parceiros, por serem considerados o “individuo mais forte”. Ou seja, uma mais-valia na defesa do individuo feminino, e por sua vez,  na contribuição para a sobrevivência da espécie.







Depois, a adaptação da vida nómada à sedentarização, o desenvolvimento da agricultura e a domesticação animal, onde o individuo masculino volta a atuar fortemente sobre o trabalho pesado de domar e selecionar os animais para fins produtivos, para dai tirar o seu alimento. Toda esta conjuntura associada à mitologia, religiões e formas de encarar a própria vida, formou uma autêntica “salada russa” para desembocar nas culturas onde o bovino está inserido, tais como jogos taurinos que deram origem à corrida de toiros atual, ou até formas de tauromaquia popular como é a tourada à corda na ilha Terceira e já espalhada por outras ilhas do arquipélago dos Açores.







Desenvolvidas as  técnicas da agricultura, cresce toda uma diversidade criada pelo Homem, como é exemplo um grande número de raças. Das raças de bovinos existentes atualmente, nenhuma delas transporta consigo o legado ancestral que tem a Brava de Lide (toiro de lide, ou toiro bravo) derivado ao confronto que se produz na corrida de toiros entre homem e bovino. O remontar às origens da humanidade entre a sorte, azar, realidade de viver ou morrer, criando arte através do toureio, é uma evolução cultural de grande magnitude e com todos os argumentos para ser defendida e definida como cultura universal e património imaterial da humanidade.







Outro aspeto não menos importante, é a criação de um animal como o toiro bravo, que transporta consigo uma carga imensa de valores, cujo seu criador “Homem” evaca-os como exemplos a seguir, mas muitas vezes não os consegue colocar em prática. A dignificação do toiro, por parte do seu criador e predador “Homem”, durante e após a sua vida, é um ato real e culto total ao animal que na cadeia alimentar humana é presa. Destaque para os indultos, onde se oferece a vida a uma presa, ato misericordioso que jamais qualquer outro grande predador faria na natureza.







Esta imagem, o momento da colocação dos ferros durante a faina de campo, a ferra, é portanto, um ponto crucial de toda esta história, ou História, como preferirem. É a partir deste ponto que esta rês ganhou uma identidade, para que um dia seja recordada na sociedade humana como um toiro que encheu a memória e coração de milhares de pessoas. Por tudo isto, a ferra é um ponto no rumo à glória de duas espécies tão magníficas e singulares, como o Homem e o Bovino na figura do Toiro Bravo de Lide.

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