sexta-feira, 16 de dezembro de 2011

Para Além de Um Olhar





Não sou por norma um bom escritor, mas reflectir é algo que me dá prazer. Aliando os meus pensamentos ao gosto que tenho por fotografar, levou-me a experimentar um novo modelo, isto é, reflectir sobre um olhar, uma fotografia ou um momento. O maior motivo que me move pela festa brava, é o toiro. Não poderia ter começado com melhor foto, pois vou contar um pequeno excerto da vida de um toiro e da sua “mãe” (ganadaria brava).

No ano de 2005 a ganadaria Eliseu Gomes da Ilha Terceira adquiriu 26 toiros de várias ganadarias portuguesas. Neste grupo encontrava-se um toiro cárdeno (saro, na gíria taurina insular), salpicado e de córnea bem desenvolvida. Este animal procedia da ganadaria de Irmãos Dias, localizada em Benavente, talvez a mais representativa do encaste português Norberto Pedroso.

No início da Primavera de 2008, mais propriamente no mês de Março, tive o privilégio de poder fotografar os toiros da ganadaria de Eliseu Gomes durante a hora da refeição, e captar o olhar deste toiro, ferro Irmãos Dias. O poder e o mistério que transmite o olhar de um toiro desperta em nós, Humanos medo, mas ao mesmo tempo curiosidade na aproximação a este animal. Poderia dizer que foi essa curiosidade de aproximação pelo seu olhar cativante, que me levou a disparar.

Para além do medo, poder e mistério, o olhar deste toiro, associado à manja, e à presença do intruso (fotografo), denota desconfiança. A expressão do animal também indica alguma carência alimentar, mais acentuada pela depressão do seu flanco direito.

O alimento colocado à disposição do animal é uma rama de faia do norte ou incenso, e apesar do toiro não estar muito magro, denota alguma perca de condição corporal. Esta caracteristica deve-se certamente ao défice energético na alimentação, condições climatéricas e falta de erva em pastagem muitas vezes de qualidade reduzida. A redução da condição corporal e o pelo comprido, são caracteristicas habituais nas reses das ganadarias da ilha Terceira no mês de Março, pois ainda abunda a precipitação, o frio, a humidade e o vento.

Observar esta foto apenas pelo esplendor do olhar de um toiro é limitar a sua abrangência. Nesta imagem também permanece a resistência dos animais perante as dificuldades impostas pelo meio, bem como as dificuldades de manutenção de uma ganadaria brava, que não é mais do que uma família que contribui para o culto de um povo.

Um comentário:

  1. Que título bem posto! A fotografia e o texto fazem-nos ver muito além, para lá e para cá. Para lá, falam do animal, da terra, da história. Para cá, revelam o aficionado, o técnico, o artista..., o homem. E uma alma partilhada. Aliás, a arte é a alma partilhada.

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