Não sou por norma um bom escritor, mas reflectir é
algo que me dá prazer. Aliando os meus pensamentos ao gosto que tenho por
fotografar, levou-me a experimentar um novo modelo, isto é, reflectir sobre um
olhar, uma fotografia ou um momento. O maior motivo que me move pela festa
brava, é o toiro. Não poderia ter começado com melhor foto, pois vou contar um
pequeno excerto da vida de um toiro e da sua “mãe” (ganadaria brava).
No ano de 2005 a ganadaria Eliseu Gomes da Ilha Terceira
adquiriu 26 toiros de várias ganadarias portuguesas. Neste grupo encontrava-se
um toiro cárdeno (saro, na gíria taurina insular), salpicado e de córnea bem
desenvolvida. Este animal procedia da ganadaria de Irmãos Dias, localizada em
Benavente, talvez a mais representativa do encaste português Norberto Pedroso.
No início da Primavera de 2008, mais propriamente no
mês de Março, tive o privilégio de poder fotografar os toiros da ganadaria de
Eliseu Gomes durante a hora da refeição, e captar o olhar deste toiro, ferro
Irmãos Dias. O poder e o mistério que transmite o olhar de um toiro desperta em
nós, Humanos medo, mas ao mesmo tempo curiosidade na aproximação a este animal.
Poderia dizer que foi essa curiosidade de aproximação pelo seu olhar cativante,
que me levou a disparar.
Para além do medo, poder e mistério, o olhar deste
toiro, associado à manja, e à presença do intruso (fotografo), denota
desconfiança. A expressão do animal também indica alguma carência alimentar, mais
acentuada pela depressão do seu flanco direito.
O alimento colocado à disposição do animal é uma rama
de faia do norte ou incenso, e apesar do toiro não estar muito magro, denota
alguma perca de condição corporal. Esta caracteristica deve-se certamente ao défice energético na
alimentação, condições climatéricas e falta de erva em pastagem muitas vezes de
qualidade reduzida. A redução da condição corporal e o pelo comprido, são caracteristicas habituais nas reses das ganadarias
da ilha Terceira no mês de Março, pois ainda abunda a precipitação, o
frio, a humidade e o vento.
Observar esta foto apenas pelo esplendor do olhar de
um toiro é limitar a sua abrangência. Nesta imagem também permanece a
resistência dos animais perante as dificuldades impostas pelo meio, bem como as
dificuldades de manutenção de uma ganadaria brava, que não é mais do que uma família
que contribui para o culto de um povo.
Que título bem posto! A fotografia e o texto fazem-nos ver muito além, para lá e para cá. Para lá, falam do animal, da terra, da história. Para cá, revelam o aficionado, o técnico, o artista..., o homem. E uma alma partilhada. Aliás, a arte é a alma partilhada.
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